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O aconselhamento noutético, termo cunhado por Jay Adams, é uma abordagem cristã ao cuidado pastoral e psicológico que se baseia na Bíblia como a autoridade suprema para diagnosticar e tratar os problemas espirituais e emocionais. A palavra “noutético” vem do grego noutheteo, que significa “admoestar” ou “instruir”. O foco do aconselhamento noutético está na transformação pela renovação da mente (Romanos 12:2) e na confrontação do pecado como a causa raiz dos problemas, sempre visando a restauração espiritual da pessoa através do arrependimento e da fé em Cristo.

Neste contexto, uma das questões-chave que o aconselhamento noutético aborda é o vício, que é muitas vezes entendido como uma forma de idolatria. A conexão entre idolatria e vício é essencial para compreender como o aconselhamento bíblico trata esses problemas. Vamos explorar essa relação, examinando o conceito de idolatria na Bíblia, como ele se aplica ao vício e de que maneira o aconselhamento noutético confronta e oferece uma solução para esses desafios.

1. O Conceito de Idolatria na Bíblia

A idolatria é condenada de forma contundente em toda a Escritura. Desde o primeiro dos Dez Mandamentos — “Não terás outros deuses diante de mim” (Êxodo 20:3) — até as advertências no Novo Testamento (1 João 5:21), a Bíblia ensina que a idolatria é colocar qualquer coisa ou pessoa no lugar que pertence a Deus. Em seu sentido literal, a idolatria envolve a adoração de imagens e falsos deuses. No entanto, a Escritura também lida com uma forma mais sutil de idolatria, que é a idolatria do coração.

Ezequiel 14:3 fala sobre como os anciãos de Israel “levantaram ídolos em seu coração”, mostrando que a idolatria não é apenas externa, mas uma questão interna. Qualquer coisa que seja mais importante que Deus, seja o prazer, a segurança, o poder ou a aprovação dos outros, pode se tornar um ídolo.

O Novo Testamento confirma essa ideia:

• Colossenses 3:5: “Mortificai, pois, os vossos membros que estão sobre a terra: a prostituição, a impureza, o apetite desordenado, a vil concupiscência e a avareza, que é idolatria”.
• Efésios 5:5: “Porque bem sabeis isto: que nenhum devasso, ou impuro, ou avarento, o qual é idólatra, tem herança no Reino de Cristo e de Deus”.

Esses textos mostram que os pecados relacionados aos desejos desordenados (avareza, impureza, etc.) são identificados com a idolatria. O ídolo não precisa ser uma estátua; pode ser qualquer coisa que o coração deseja mais que a obediência e o relacionamento com Deus.

2. O Vício como Idolatria

No aconselhamento noutético, os vícios — seja em drogas, álcool, pornografia, jogos de azar ou qualquer outro comportamento compulsivo — são vistos como formas de idolatria. Isso ocorre porque o vício envolve entregar-se a algo que a pessoa considera essencial para sua satisfação ou bem-estar, em vez de depender de Deus para encontrar paz e contentamento.

O vício é, em sua essência, uma tentativa de satisfazer um desejo profundo de significado, prazer ou alívio, fora de Deus. Tal comportamento coloca a substância ou a atividade no lugar de Deus, fazendo com que o indivíduo dependa dela para sua felicidade e estabilidade. É o que Tim Keller chama de “ídolos do coração” — qualquer coisa que amamos, confiamos ou obedecemos mais do que Deus.

Exemplos de como o vício reflete idolatria:

• Substituição de Deus: Assim como a idolatria substitui Deus por um ídolo, o vício substitui a dependência de Deus pela dependência de uma substância ou comportamento.
• Busca de alívio: Em vez de buscar consolo e paz no Senhor (Filipenses 4:6-7), o viciado busca alívio em seu vício, esperando que ele resolva suas dores ou ansiedades.
• Obediência a outro “senhor”: Romanos 6:16 ensina que somos servos daquele a quem obedecemos. O vício faz da pessoa um escravo do desejo, em vez de um servo de Deus.

3. O Aconselhamento Noutético: Confrontando a Idolatria e o Vício

O objetivo do aconselhamento noutético é, primeiramente, diagnosticar o problema sob uma perspectiva bíblica e, em seguida, usar a Escritura para corrigir e restaurar a pessoa à comunhão com Deus. Quando o vício é tratado como idolatria, o aconselhamento noutético confronta diretamente o pecado envolvido e oferece o remédio espiritual: arrependimento e fé no Evangelho.

Três passos no aconselhamento noutético para lidar com o vício como idolatria:

1. Identificação e Confronto do Pecado: O aconselhamento noutético começa com a confrontação direta do pecado. A Bíblia chama o conselheiro a expor a verdade e a admoestar com amor (Colossenses 3:16). O viciado é confrontado com a realidade de que seu comportamento é uma forma de idolatria, afastando-o de Deus e levando-o à escravidão.
2. Arrependimento e Renovação da Mente: Após o pecado ser identificado, o conselheiro orienta o indivíduo a buscar arrependimento. O arrependimento envolve uma mudança de mentalidade (metanoia), reconhecendo que o vício não é apenas um problema de comportamento, mas de adoração desordenada. O foco está em voltar-se para Deus, conforme Romanos 12:2: “Transformai-vos pela renovação da vossa mente”. Isso ocorre através da aplicação constante das verdades bíblicas ao coração.
3. Substituição do Ídolo por Cristo: Um princípio fundamental no aconselhamento noutético é que os ídolos do coração devem ser destronados e Cristo deve ocupar o lugar central. O viciado deve aprender a encontrar em Cristo tudo o que ele busca no vício: paz, satisfação, conforto e alegria. Salmos 16:11 afirma: “Na tua presença há plenitude de alegria, à tua direita há delícias perpetuamente”. O conselheiro ajuda o indivíduo a desenvolver hábitos espirituais que sustentem essa transformação, como oração, estudo da Palavra e comunhão com outros cristãos.

4. Conclusão

No aconselhamento noutético, o vício não é visto apenas como um problema psicológico ou físico, mas como uma questão espiritual profundamente enraizada na idolatria. O vício revela o desejo humano de buscar fora de Deus o que somente Ele pode oferecer. Ao identificar essa conexão entre idolatria e vício, o conselheiro noutético oferece uma solução bíblica: confrontar o pecado, guiar a pessoa ao arrependimento e ajudá-la a encontrar em Cristo a satisfação verdadeira e duradoura.

O apóstolo Paulo, em 1 Coríntios 10:14, nos dá uma instrução clara: “Portanto, meus amados, fugi da idolatria”. Este é o chamado para todos que enfrentam o vício — abandonar os ídolos do coração e correr para o único que pode realmente satisfazer as necessidades da alma, Jesus Cristo.

Rev. João Ricardo Ferreira de França
Ad Majorem Dei Gloriam